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BDSM Na Moda E Cultura: Da Subcultura à Tendência Mainstream.

O que é o BDSM e como tornou-se parte da sociedade? Um fetiche que diversos ainda tratam como ‘tabu’ ainda que seja consensual. O que é tão atraente no BDSM para aqueles que praticam? Controle? Submissão? Desde os primórdios da humanidade sabemos que sexo era apenas para reprodução, mas e quando vira parte do prazer? E, ainda mais importante, quando um fetiche fica tão intrínseco na sociedade que vira parte da moda e da cultura.

Uma imagem retirada de uma revista de 1880

A Evolução do Fetichismo

Mesmo que não tenha essa nomenclatura desde sua origem, encontramos diversos textos onde falam sobre “BDSM” apesar de ainda não ser chamado dessa forma.

No Kama Sutra, criado na índia, milênios atrás, tínhamos diferentes maneiras de bater com intenção de causar prazer. Havia também expressões diferentes quando essa dor é causada para demonstração do prazer, assim como é hoje. Apesar das poucas regras de como era praticado, era senso comum que era essa dor era causada em prol do prazer consensual.

O relato mais antigo de submissão que encontramos em pesquisas voltadas para isso está entre os sumérios. Ele vinha principalmente de figuras divinas, onde Inanna, conhecido pelo povo sumério como deusa do amor, fertilidade e do sexo. Ela fazia homens e deuses como submissos, sendo sexualmente dominante à eles, contra sua vontade.

E quanto ao Kama Sutra, é a primeira vez onde encontramos sadomasoquismo descrita de maneira consensual.

Expressões Históricas do Sadomasoquismo

Por anos encontramos escrituras, contos, pinturas, poemas e lugares como tumbas de flagelação. Tudo isso repercute ainda mais que o sadomasoquismo sempre esteve existindo entre humanos e deuses como uma forma de prazer.

A arqueologia encontrou resquícios da história fetichista durante anos, diferentes formas que a civilização foi capaz de causar prazer e dor na mesma medida. O que leva todos às questões levantadas por Michel Foucault em como relacionamos libido e sexo ao ato da penetração, sem que outras coisas sejam exploradas sem remorso, transformando anos de exploração sexual em absoluta vergonha.

A palavra ‘fetiche’ foi popularizado pela companhia francesa Yva Richards durante os anos 20, mesmo que tivesse ganhado esse nome dois séculos antes. É importante recordar que, historicamente, esse termo surgiu após a 1ª guerra mundial que gerou um trauma para aquela geração. Isso reforça a teoria de Sigmund Freud que acredita que esses fetiches são uma forma de expressar traumas.

Sendo o BDSM algo essencialmente interligado à comunidade LGBTQIA+, esses fetiches existem como uma forma de evidenciar ainda mais quando nossa sociedade passa por uma crise. Depois de tantos traumas sociais causados nessa geração, após pandemia e em meio de guerras, não existe contexto melhor para moda introduzir novamente os elementos fetichistas em nossa cultura. Atualmente, anos após passarmos por uma crise de saúde mundial com a quarentena, e agora, entrando em uma recessão econômica, estamos no mesmo lugar onde nossos predecessores estavam mais de setenta anos atrás. Procuramos formas de expressar o que existe internamente em nós, seja de forma artística ou sexual, e no melhor dos casos, ambos.

Imagem retirada do Leilão de Arte Brasileira.

O Fetichismo na Moda e na Arte

O fetichismo virou parte da arte logo após entrar no circuito da moda. Sendo assim, ganhou espaço entre os artistas que estavam explorando o homoerotismo nessa época, reafirmando sua posição como uma forma de liberdade.

Tom of Finland, é um dos nomes mais falados dentro do movimento com seu trabalho de caráter homoerótico, sendo um artista icônico para comunidade queer. Assim como ele, Peter Berlim também teve um trabalho significativo dentro dessa área fetichista e homoerótica nos anos 60, com suas selfies eróticas, sexualizadas e marcadas pelas calças de couro justas, uma das peças icônicas do sadomasoquismo.

Outro nome importante nos primórdios do fetichismo sadomasoquista na moda é o designer austríaco Rudi Gernreich, que fugiu da Alemanha nazista. Ele encontrou refúgio dentro dos Estados Unidos, e princiapalmente no movimento LGBTQIA+ daquela época que estava ganhando uma força cada vez maior. Rudi utilizava dos design de moda como uma forma de expressar sua sexualidade.

O designer foi responsável pela criação do monokíni e da calcinha “thong”, recebendo grande destaque durante os anos 60. Rudi tinha uma visão bastante avant-garde e inovadora sobre moda e sexualidade, assim, influenciando uma grande parcela da moda queer dos anos 60 e utilizando aquele meio como uma forma de liberdade para sua arte. Reforçou esse laço entre o fetichismo e a comunidade, e também influenciou muitos artistas depois dele, como Helmut Lang e Thierry Mugler.

Nomes como Vivienne Westwood, Helmut Lang, Thierry Mugler e Jean Paul Gaultier surgiram na modernidade como precursores da moda fetichista e sadomasoquista, com diferentes estilos, adaptando tudo à sua própria interpretação.

Durante os anos 70, existiu a popularização do punk saindo das ruas e indo parar nas passarelas, Westwood foi uma das pioneiras do fetichismo da moda. Por conseguinte, ela conheceu Malcom McLauren, seu parceiro e sócio na ascensão punk em Londres, e abriram a boutique SEX. Com seu estilo inspirado no motociclismo e no fetichismo, couro e látex eram as principais chaves do que fazia suas roupas tão populares. Posteriormente, a boutique virou parte do circuito de compras da galera alternativa de Londres daquela época, rendendo um status que Vivienne Westwood manteve até seu falecimento.

Ainda naquela mesma década, Thierry Mugler apresentaria suas primeiras coleções, cheias de sensualidade e erotismo, com ênfase nos corsets desenhados por ele, que futuramente, seriam uma marca registrada do estilista. A visão de Mugler sobre sexualidade foram além e durante os anos 80 e 90, ele levou para as passarelas do luxo de Paris suas roupas inspiradas no fetichismo e no BDSM, com chicotes, correntes e látex.

Com o uso também de couro, harnesses e outros elementos de bondage, Jean Paul Gaultier teve um papel especialmente icônico durante essa mesma época. Dessa forma, ele levou para as passarelas tudo que tinha direito, com toda parafernália fetichista, criando para Madonna seu look icônico com o sutiã cônico.

O Fetichismo no Novo Milênio

No início dos anos 2000, caracterizada por uma libertação sexual feminina e desvalorização do conservadorismo dentro da moda e da arte, Tom Ford vai para Gucci em seu período como diretor criativo da marca. As suas coleções extremamente sensuais mudaram um status conservador que mantinham na marca.

A Versace, com Donatella liderando após Gianni falecer, também apostou no sexo e ganhou, mantendo essa ideia da sensualidade da mulher italiana e do maximalismo até os dias que Donatella saiu da marca.

Violet Chachki desfilando para Richard Quinn na Londres Fashion Week.

O movimento BDSMbondage, dominance, sadism, masochism — vai além de apenas um fetiche. É um movimento artístico que simboliza liberdade quando não era possível expressar essa vontade, em uma época onde prazer era soterrado pela ansiedade de não saber quando estariam livres das guerras. Entretanto, ainda estamos rodando em círculos. Assim como os jovens antes de nós, voltamos para necessidade de expressar essa liberdade de forma sexual pelas mesmas razões de séculos atrás. 


O BDSM é um estilo de vida e uma carta de amor à liberdade sexual.

Escrito por: Katherine Macelli | Editado por: Flavia Cavalcante

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