Desfiles,  Moda

Passarelas 90’s vs 2020

Nas últimas semanas as telas de nossos Instagram’s e TikTok’s vem sendo tomadas por vídeos comparando as passarelas dos anos 90 com as da atualidade, mas por que essas comparações acontecem?

“ […] Havia um foco intenso na estética e no glamour, com roupas e cenários extravagantes. A exclusividade era uma característica marcante, com desfiles sendo eventos reservados para a elite da moda, compradores, celebridades e jornalistas seletos.” – diz Fabrícia Figueiró.

Fabrícia Figueiró, professora de moda no centro universitário UNA-BH. Fonte:

“[…] Você assiste aos desfiles ou aos ensaios e fica fixado no poder que elas exalavam, incontestável. Muitas com belezas clássicas, mas todas com belezas inatingíveis e surreais.” – diz João Scarponi.

João Scarponi, produtora e designer de moda.

Já na atualidade, temos passarelas mais inclusas, diversas e globais, sendo possível acompanhar um desfile na PFW direto de nossos quartos, com apenas um celular de distância. Essa prática fica clara na fala de Adriana Picinin e Carla Estrela:

“Hoje há uma pressão e esforço para representar uma variedade maior de indivíduos. Nos bastidores, a tecnologia e as mídias sociais desempenham um papel importante. Tudo sendo compartilhado em tempo real.” – diz Adriana.

“Hoje você precisa ser diferente, ter estilo, abertura para todos tipos de corpos, plus size, trans…” – foca Carla. 

Adriana Picinin, modelo e professora de modelagem.
Carla Estrela, modelo e produtora de moda.

Diversidade e aceitação

Se por um ponto a moda se tornou mais acessível, plural e tecnológica, por outro a busca pelo algoritmo que torna tudo isso em certa medida possível, também a torna mais banal, criando um momento em que o interesse se torna outro, como observa Geanneti Tavares, “[…] as prioridades passaram a ser muito mais falar sobre diversidade e inclusão, sustentabilidade […], as tendências e cores passaram a um plano abaixo ou tiveram que se submeter a esses novos interesses.”

Geanneti Tavares, professora de moda no centro universitário UNA-BH

Aceitação nas passarelas

Não que esses interesses sejam ruins, pelo contrário, existe um acordo entre todos os entrevistados que a diversidade é necessária. O problema na atualidade não é a diversidade, e sim a constante busca pela aceitação do algoritmo, ainda mais quando este não busca por qualidade. Quantas vezes não vimos trabalhos feitos por influencers que poderiam ter uma maior qualidade técnica se realizados por modelos? Camila Kramberger e Camila Vanni observam isso:

“[…] tem meninas que estão no models.com que são super conhecidas no meio das modelos mas se você colocar ela para abrir um desfile, ninguém conhece ela fora do meio (da moda) então acaba não dando engajamento.” – observa Kramberger.

Camila Kramberger, modelo e estudante.

“[…] a gente fica sempre chateado quando vê um trabalho que antes você fazia uma “modelo”, uma influencer se chamando de modelo ali fazendo, as vezes você detecta erros técnicos e tal coisas que você faria muito melhor mas ela tá ali por que é uma influencer.” – diz Vanni.

Camila Vanni, modelo e estudante

E numa moda em que o algoritmo se torna o mais importante, qual é o espaço das modelos? Se por um lado a década de 1990 ficou marcada pelas heroin chic, famosas pelos distúrbios, drogas e aparente falta de saúde, no presente estes profissionais têm suas humanidades respeitadas? Eduarda Ribeiro e Olívia Amanda concordam que sim, mas que ainda podemos melhorar.

“[…] com uma moda feita para todos e que respeite a diversidade de nossos corpos para que seja acessível para qualquer pessoa, no caminho que estamos já se consegue ter voz e espaço para a diversidade, claro que sempre se necessita de mais e mais espaço para todos e qualquer minoria.” – pontua Eduarda.

Eduarda Ribeiro, modelo.

Mudanças nas passarelas

“Sim, atualmente, os modelos de passarela são, em geral, vistos de maneira mais humanizada do que nos anos 90. […] A promoção da diversidade real e inclusão é um passo crucial. Além disso, medidas contínuas para combater os estereótipos de beleza inatingíveis e o apoio à saúde mental dos modelos são essenciais para garantir uma abordagem ainda mais humanizada na indústria da moda.” – diz Olívia.

Olívia Amanda, modelo e estudante.

Entrevistas

Entrevistados: Eduarda Ribeiro, Camila kramberger, Carla Estrela, João Scarponi, Camila Vanni, Fabrícia Figueiró, Adriana Picinin, Geanneti Tavares, Olivia Amanda

Carla Estrela

1 – Na sua opinião, qual é a maior diferença entre as passarelas dos anos 90 e as atuais? E nos backstages, qual seria a maior diferença nesses dois períodos?

R:Elegância, pivo, tirar o casaco, era bem chique. Hoje você precisa ser diferente, ter estilo, abertura para todos tipos de corpos, plus size, trans.

Eduarda Ribeiro

2 – Em quais modelos você se inspira/inspirou para sua construção de carreira? Acredita que faz diferença ter referências de profissionais que combinem com as características exigidas atualmente? 

R:Como toda modelo as principais inspirações também vieram daquela época, com o surgimento das super modelos consideradas mais que celebridades, como Linda Evangelista, Gisele Bündchen, Naomi Campbell, que traziam em si o poder de uma modelo nas passarelas de uma forma extremamente única e glamurosas né. Eu me adequo a esse perfil de uma forma que esse empoderamento e a força de expressão que podemos passar com esse posicionamento na moda.

Camila Kramberger

3 – Como a busca por engajamento influencia o formato das passarelas presentes e o trabalho dos modelos? E como você se adequa a isso?

R:A busca por engajamento tem dado bastante bafafá no mundo da moda, muito na questão de contratar mulheres que nem são modelos para desfilar, por exemplo, mulheres que não são modelos para fazer trabalhos das modelos, acho que isso tem sido um grande ponto de discussão, porque acaba que nós como modelos que temos uma super trajetória, toda uma carreira construída, fomos atrás, buscamos nos tornar modelo, e aí vem uma blogueira e colocam ela para abrir um desfile para dar engajamento.

Mas assim é uma discussão complicada de se entrar, porque querendo ou não, se você coloca uma modelo profissional que ela é conhecida no meio das modelos, por exemplo tem meninas que estão no models.com que são super conhecidas no meio das modelos mas se você colocar ela para abrir um desfile, ninguém conhece ela fora do meio (da moda) então acaba não dando engajamento. Mas enfim, não tenho uma opinião formada sobre, foi só um comentário mesmo, para falar sobre o engajamento dos dias atuais, e como me adequo a isso, não me adequo haha eu continuo vivendo minha vida normal e é isso, até porque já investi muito na minha carreira de modelo mas hoje em dia fiz uma pausa por causa dos meus estudos.

João Scarponi 

4 – Em comparação aos anos 90, atualmente os profissionais que trabalham modelando são vistos de maneira mais humanizada? Podemos melhorar mais? Como? 

R: A década de 90 tem seu mérito pela mudança na tratativa com as modelos, que deixaram de serem vistas como meros cabides e assumiram maior protagonismo em cena. Com isso as chamadas supermodelos à medida que foram alcançando maior fama passaram a realizar maiores exigências e a cobrar maiores cachês.

“Não me levanto da cama por menos de dez mil dólares” é a frase icônica de Linda Evangelista que representa bem isso. No final da década era consenso geral entre críticos e criadores de moda que havia um show de estrelismo o que culminou no declínio das supermodelos e um retorno para a escolha de modelos mais reais – que posteriormente é associado ao triunfo da Gisele, reconhecida como uma modelo extremamente profissional e humanizada, no sentido positivo da palavra. Sempre podemos melhorar, ainda é um mercado muito efêmero e pouco regularizado. Já avançamos muito, mas com toda certeza há muito a ser conquistado.

Camila Vanni

5 – Por vezes a Golden Era das passarelas é relembrada com nostalgia e carinho como um momento que principalmente as modelos eram tratadas como verdadeiras celebridades, por vezes deusas de um universo distante, único e glamouroso. Você acredita que esse pensamento faça jus a esse momento da moda quando falamos das profissionais que modelam? Por que?

R:Olha quando a gente é modelo a gente vê que de glamour não tem nada nessa vida das passarelas, mas acredito sim que existia esse glamour pra modelos que atingiam um certo patamar de notoriedade, e atualmente tem muito mais modelo, tem muito mais concorrência, e obviamente com esse tanto de menina fica difícil você achar algumas que vão se destacar, então não existe mais aquilo de você criar uma Gisele Bündchen, não sei se vai existir algo do tipo pra frente mas eu creio que não, eu acho que isso passou que isso acabou.

R: Sim. A Era Dourada das passarelas dos anos 90 é frequentemente lembrada por sua aura de exclusividade e glamour

Sendo assim, modelos e profissionais da época eram icônicas. 

Esse pensamento faz jus ao momento, pois a indústria era mais seletiva criando um misto de admiração e inspiração. – Adriana Picinin

Geanneti Tavares

6 – O que você pensa sobre as comparações do público diante as diferenças entre a década de 1990 e 2020?

R:Entendo que a principal diferença em termos estéticos da moda das duas décadas é que a de 1990 era mais minimalista e a da década de 2020 é bem mais diversificada. A introdução da cultura de brechó começou na década de 1990 e hoje tem lugar assegurado nos guarda-roupas de muitas mulheres, sem nenhum preconceito. Também temos uma maior aceitação da moda autoral, isto é, uma moda feita por designers que desejam projetar sua identidade no processo criativo e que tem a sustentabilidade como base.

A década de 1990 deixou uma marca importante e que, hoje, é não somente esteticamente agradável, mas necessária, pensando na sustentabilidade: o minimalismo. Outro fato é que o ciclo da moda faz com que pessoas que cresceram na década de 1990 revivam as tendências com satisfação nostálgica, enquanto as gerações mais jovens vão curtir esse retorno conhecendo o estilo retrô. Essa revisitação é bem comum na moda. Na década de 2030, pode ser que desejemos reviver a década de 2010. Saberemos em breve.

Olívia Amanda

7 – Se você pudesse escolher entre começar a sua carreira neste momento ou a 30 anos atrás, qual você escolheria e por que?

R: Como modelo de passarela, a decisão de começar minha carreira hoje ou há 30 anos atrás dependeria do contexto e das oportunidades disponíveis em cada época. Começar há 30 anos atrás poderia oferecer a chance de ser pioneira em um período marcante da moda, mas também poderia envolver desafios diferentes, como uma maior falta de diversidade e inclusão. Começar hoje ofereceria a vantagem de uma indústria mais consciente e diversa, mas também um cenário altamente competitivo. A escolha dependeria das metas e valores do momento presente, e ambas as opções teriam seus méritos e desafios únicos. Levando em consideração de que os dois teriam a mesma inclusão, diversidade e a indústria fosse mais consciente em ambos, eu escolheria há 30 anos atrás, sou completamente fascinada pela moda, estilos de desfile e as ousadias que alguns modelos conseguem levar para o nosso palco. –

Fabrícia Figueiró

8 – Quais eram as prioridades numa passarela na década de 1990? E quais são as prioridades nas passarelas atuais?

R:Além das prioridades acima mencionadas, uma grande diferença é a abertura das passarelas atuais para vozes e influências diversas, em contraste com o foco mais homogêneo e exclusivo dos anos 90. Em relação aos backstages, nos anos 90, os bastidores eram fechados e exclusivos, raramente vistos pelo público em geral. Agora, com o advento das redes sociais, os bastidores tornaram-se parte da experiência, com modelos e designers compartilhando momentos de preparação e interagindo com o público. Hoje os backstages também contam com a presença de influenciadores e estudantes de moda. Nesta edição do MinasTrend, por exemplo, a Una terá uma equipe de alunos do curso de Moda e dos cursos de Comunicação com acesso livre ao evento, fazendo a cobertura dos desfiles, dos bastidores e do salão de negócios, além da produção de um editorial ao final do evento.

Escrito por: Pedro Cardiel | Editada por: Gabriela Andrade

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