
Moda e Liberdade: O Poder da Alfaiataria Negra no Met Gala 2025
O maior evento da moda acontece hoje (5) e celebra a expressão e resistência da alfaiataria negra masculina, com anfitriões de destaque e um tapete vermelho cheio de significado.

Foto por David Lee, Warner Bros
A primeira segunda-feira de maio chegou e, com ela, a expectativa de todos os amantes da moda. Como de costume, é dia de Met Gala 2025, o tradicional evento beneficente realizado no Metropolitan Museum of Art, em Nova York, para arrecadação de fundos destinados à exposição anual do Costume Institute.
Neste ano, o tema escolhido é “Superfine: Tailoring Black Style”, com um dress code traduzido como “Feito sob medida para você”. A proposta celebra a herança e a sofisticação da alfaiataria negra, destacando seu papel na construção de identidade, elegância e resistência ao longo da história.
A inspiração veio do livro da pesquisadora Monica L. Miller, “Slaves to Fashion: Black Dandyism and the Styling of Black Diasporic Identity” (“Escravos da Moda: Dandismo Negro e o Estilo da Identidade Negra Diásporica”). A exposição associada ao evento reunirá roupas históricas, pinturas, fotografias e artefatos que traçam a evolução do estilo negro do século XVIII até os dias atuais.

Este ano, os anfitriões escolhidos para o mega evento são o ator Colman Domingo, o piloto de Fórmula 1 Lewis Hamilton, o rapper A$AP Rocky e o cantor Pharrell Williams, que também atua como diretor criativo da Louis Vuitton. Como de costume, Anna Wintour integra o grupo, e LeBron James se junta como presidente honorário.
Cada um desses nomes carrega uma identidade marcante e uma relação profunda com estilo e representatividade. Um exemplo memorável foi o look de Lewis Hamilton no Met Gala de 2024, em que trajava um conjunto personalizado da Burberry, com casaco preto adornado com detalhes florais, sobre um terno transpassado. A peça não apenas dialogava com o tema “The Garden of Time”, como também homenageava John Ystumllyn, o primeiro jardineiro negro do Reino Unido.
Todos esses nomes transitam entre a tradição e a inovação, usando peças clássicas associadas à história da moda preta e reinterpretando-as com um olhar contemporâneo.
O Dandismo Negro
Ao contrário do que muitos pensam, a vestimenta é uma ferramenta que pode ser tão perigosa quanto poderosa. Desde os tempos da realeza europeia, reis e rainhas utilizavam roupas como símbolo de poder e distinção, tons como vermelho e dourado, além de tecidos nobres, eram reservados às elites para marcar visualmente sua superioridade sobre os plebeus.
Com o passar dos séculos, esse uso estratégico da aparência se transformou, mas não desapareceu.
O dandismo negro, por sua vez, carrega camadas ainda mais profundas de significado. Aqui, não se trata de ostentação ou superioridade, mas de resistência e afirmação de identidade. Homens negros escravizados e seus descendentes apropriaram-se de códigos estéticos da aristocracia branca para reivindicar humanidade, dignidade e presença. Ao vestir-se com elegância refinada, muitos romperam visualmente com os estereótipos impostos e reescreveram a própria narrativa com estilo, sofisticação e propósito.

Durante muito tempo, leis determinaram que tipos de roupas os escravizados podiam usar, proibindo-os de trajar qualquer vestimenta que sugerisse status social elevado. Os tecidos deveriam ser baratos, e as cores, neutras ou apagadas.
A figura do dândi negro começa a se consolidar como um modelo de liberdade e resistência após as abolições da escravidão na Europa nos anos de 1761 e 1848 e nos Estados Unidos, em 1865. No entanto, a imagem do homem negro elegante passou a ser ridicularizada nos espetáculos blackface, populares no final do século XIX, que zombavam de sua tentativa de se vestir com elegância e dignidade.
Zoot Suit: A Força de um Terno
Popularizados nos anos 1940, os Zoot Suits tornaram-se símbolo de estilo, identidade e afirmação cultural entre a população negra dos Estados Unidos. Em bairros de baixa renda, vestiam-se assim para se destacar e acessar o imaginário do luxo e da vaidade, mesmo em meio à forte segregação racial. O estilo também foi adotado pela comunidade latina da Califórnia, influenciada pela cultura negra e igualmente em busca de uma expressão identitária.
Um dos nomes mais icônicos ligados a esse estilo foi Malcolm X. Em sua autobiografia, The Autobiography of Malcolm X, escrita em colaboração com o jornalista Alex Haley e publicada em 1965 , o ativista dos direitos humanos e defensor do nacionalismo negro descreve o Zoot Suit que usava com as respectivas características: “um terno com calças azul-celeste de 76 centímetros no joelho, afuniladas para 30 centímetros na parte inferior, e um casaco longo que apertava a cintura e alargava abaixo dos joelhos”. Esteticamente exagerado, o traje tinha o propósito de protestar, ainda que silenciosamente, era uma forma de garantir que aquele grupo não fosse ignorado.
Confiram o trailer “Malcom X (1992)”: https://www.youtube.com/watch?v=sx4sEvhYeVE
Apesar da crescente visibilidade das populações afro-americana e latina, o estilo dos Zoot Suits passou a incomodar autoridades e militares, especialmente em tempos de guerra. Com os Estados Unidos envolvidos na Segunda Guerra Mundial, o país enfrentava um período de racionamento de tecidos, e os trajes volumosos e extravagantes dos Zooters foram classificados como “antipatrióticos”.
Marinheiros e oficiais acusaram esses jovens de afrontarem o esforço de guerra, usando como desculpa o consumo excessivo de pano para justificar atos de violência. A repressão ganhou ares de “dever cívico”, mas por trás disso estava o velho racismo disfarçado de moralidade nacionalista.

Foto por David Lee, Warner Bros
Na noite de ontem, 04/05, a cantora Tyla, uma das convidadas de honra do Met Gala 2025 deste ano, foi vista desfilando pelas ruas de Nova York com um look icônico da coleção AW25 ‘ORI – Upon Reflection’, da designer emergente britano-nigeriana Tolu Coker, uma criação com referências ao clássico Zoot Suit.
O Que Esperar do Tapete Vermelho do Met Gala 2025?
Além das referências históricas ao dandismo negro, que exalta poder e criatividade, e da alfaiataria reinterpretada inspirada nos Zoot Suits, podemos esperar uma verdadeira explosão de estilo no tapete vermelho. Cores vibrantes, listras ousadas, silhuetas marcantes e detalhes clássicos da moda masculina, como chapéus, bengalas, broches, gravatas e lenços de bolso, serão desconstruídos e repensados para criar um visual autêntico e inovador.
O dress code deste ano, “Feito sob medida para você”, oferece aos convidados a explorarem a individualidade e a personalidade de cada um. Essa liberdade criativa pode se manifestar de diferentes formas, sempre com a missão de destacar a essência única de quem veste, seja por meio de uma peça de alfaiataria impecável ou algo mais ousado e contemporâneo.
Outro ponto a ser destacado é a expectativa de maior presença de designers e estilistas negros no evento deste ano, assim como as homenagens prestadas a grandes figuras negras da cultura no geral. Um exemplo marcante é o André Leon Talley, jornalista de moda, estilista, diretor criativo, autor e editor geral da revista Vogue Americana (de 1983 a 1987), cuja trajetória deixou um legado significativo no universo da moda.
A alfaiataria, sendo uma arte delicada e personalizada, desempenha um papel fundamental nesse processo. A verdadeira missão de cada marca será traduzir, por meio da vestimenta, a mensagem interior da celebridade que a representar nos holofotes, revelando ao mundo sua essência e utilizando a indumentária como uma poderosa ferramenta de expressão e identidade.

Reprodução Umberto Fratini / Gorunway.com

Reprodução Vogue Runway
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Escrito por: Giovanna Té Bassi | Editado por: Flávia Pereira