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Verão Chanel: Uma Ode à Herança e à Reinvenção

A última coleção antes do novo diretor criativo, Matthieu Blazy, cativa com cada silhueta — um diálogo entre eras e um chamado à renovação na Alta Costura Verão 2025 da Chanel.

A passarela em formato de duplo “C” da Chanel, projetada pelo cenógrafo Willo Perron, foi o palco do desfile da coleção de verão da alta-costura no icônico Grand Palais, em Paris. Embora Matthieu Blazy, ex-diretor criativo da Bottega Veneta, tenha sido recentemente nomeado como o novo diretor criativo da Chanel, sua estreia oficial está programada para a Semana de Moda de Paris prêt-à-porter em setembro de 2025. Portanto, esta coleção ainda foi desenvolvida pela equipe de design interna da maison.

A coleção apresentou uma variedade de peças que combinam tradição e inovação, refletindo a capacidade da marca de se reinventar continuamente. A presença de luxuosas sedas, bordados brilhantes e abundância de detalhes remeteram à rica herança da Chanel.

A coleção celebrou os 110 anos de Haute Couture da Chanel, destacando a liberdade criativa ilimitada e o savoir-faire excepcional que definem a maison desde 1915, quando Gabrielle Chanel inaugurou sua casa de alta-costura. O desfile trouxe uma fusão entre tradição e inovação, reafirmando a habilidade da grife em se reinventar sem perder sua identidade.

Savoir-faire, expressão francesa que significa “saber fazer”, no universo da moda remete à maestria artesanal e ao conhecimento transmitido por gerações, evidenciado no primor técnico e na atenção meticulosa aos detalhes. Luxuosas sedas, bordados cintilantes e uma profusão de rosetas resgataram a rica herança da marca.

Os detalhes etéreos da nova coleção da Chanel

O verão da Chanel apresentou a silhueta preppy em alta, com muitas mini-saias. O tweed colorido foi o protagonista, explorado em diversas versões: mangas princesa, volumosas e até adornadas com plumas. A essência sofisticada da grife ganhou leveza e romantismo, remetendo às coleções de Virginie Viard, com um toque fluido e feminino, porém sofisticado.

Diferente de outras coleções desta temporada de alta-costura, a Chanel manteve sua identidade essencialista. Sem excessos performáticos, apenas revisitando seus clássicos de maneira contemporânea e delicada.

Elementos como laços, plumas e cintos complementaram os looks, enquanto babados brilhantes e bordados trouxeram textura e refinamento. Em paralelo às demais maisons que exploraram um romantismo sensual com tule e renda, Chanel reinterpretou essa estética de forma mais polida.

As peças ajustadas ao corpo, porém não rígidas, equilibraram fluidez e estrutura. Referências vintage surgiram nos casaquetes de tweed arredondados, evocando o passado, enquanto os ombros volumosos remetiam a uma aura vitoriana.

A presença dos ombros volumosos, por si só, carrega um simbolismo profundo. Não apenas como um resgate de épocas passadas, mas como uma poderosa afirmação de força e resistência.

O volume exagerado dos ombros, com sua referência a armaduras e capas de poder, traz à tona a ideia de resistência, poder e confronto. Enquanto no passado a estrutura rígida e os ombros imponentes eram sinônimo de grandeza e opulência, como na era vitoriana, hoje, eles ganham um novo significado.

O foco nos ombros, uma característica marcante dessa coleção, evoca uma reflexão sobre as questões contemporâneas de poder, classe e luta por igualdade. Como um reflexo das transformações sociais atuais, essas silhuetas imponentes não só evocam a estética clássica da alta-costura, mas também remetem à capacidade das mulheres de se posicionar com firmeza diante dos desafios do presente.

Apesar da construção meticulosa, a fluidez permaneceu tanto nas saias evasê acima do joelho quanto nos vestidos longos. A transparência apareceu de maneira elegante, sem apelo sensual exagerado. Tons dourados e creme se alternaram com nuances pastel—roxo, pink e azul—contrastando com matizes mais quentes.

Essas cores podem simbolizar a dualidade entre tradição e renovação, transmitindo frescor sem perder a sofisticação. Recortes retos e em V ressaltaram a complexidade das criações, evidenciando o domínio técnico por trás de cada peça.

O dourado, em particular, carregou um simbolismo de luxo, poder e renovação. Em tempos de crescente desigualdade social e política, o dourado pode ser lido como um comentário sobre os excessos do poder e da classe dominante. Mas também como um símbolo de resistência e renascimento.

Ao incorporar essa cor, a Chanel não apenas faz uma referência à opulência histórica. Ela também provoca uma reflexão sobre as disparidades sociais e a busca pelo brilho e pela riqueza em um momento de crise global.

O sapato Mary Jane com ponta preta fez uma reverência ao legado de Gabrielle Chanel, mantendo viva sua assinatura estética. Outro detalhe marcante foi a presença recorrente do peplum, que, ora integrado a bordados em peças fluidas, ora estruturado em blazers de tweed, reafirmando o equilíbrio entre tradição e modernidade.

A Chanel sempre provoca um refinamento essencial em suas coleções, mas também um tipo de estranheza que desafia a percepção do belo. Muitos podem achar que a marca se repete ou que suas coleções não trazem novidades impactantes. No entanto, talvez seja justamente essa estética inusitada e, ao mesmo tempo, sofisticada, que traduz o espírito de Gabrielle Chanel—questionar e transcender as convenções da moda.

Entre o legado e a renovação

Assistir a um desfile da Chanel não se resume a contemplar tecidos luxuosos e peças bem construídas, mas a refletir sobre o significado do belo e sua relevância para a mulher contemporânea. Esta coleção apresentou criações que Gabrielle usaria, ao mesmo tempo em que desmistificou padrões estéticos enraizados. Mais do que um espetáculo visual, a Chanel sempre se comunica por meio da semiótica, transformando o tweed não apenas em um símbolo de elegância, mas em uma ousadia dentro da tradição.

Com a chegada de Matthieu Blazy à direção criativa, há uma expectativa sobre como ele dará um novo fôlego à grife, trazendo uma visão renovada para a essência que já conhecemos. Talvez a Chanel precise recuperar a obsessão que um dia gerou no público, indo além do tweed e resgatando sua força como fenômeno de desejo absoluto.

Assim como Karl Lagerfeld fez nos anos 80 ao reinterpretar a marca para um novo público. Espera-se que a maison reassuma seu posto de protagonista na moda de luxo. Transcendendo o tradicionalismo, ela se reafirma como a referência máxima do setor.

Esta coleção parece ter sido uma despedida simbólica, reunindo elementos de diferentes eras—Coco, Karl e Virginie. Em cada peça, foi possível notar a influência desses três momentos da história da Chanel, além do esforço do ateliê em demonstrar por que a maison continua sendo uma das mais emblemáticas da moda. Afinal, não há outra marca como a Chanel. Ela dispensa explicações—basta olhar e sentir.

A moda reflete o mundo e, neste momento, muitas coleções expressam os impactos do nosso tempo. Em Chanel, o preto dramático simboliza a intensidade do presente, as estruturas retas remetem ao conservadorismo, mas a fluidez oferece um vislumbre de esperança.

A Chanel permanece inabalável. Como uma obra de arte, sua grandiosidade se sustenta no savoir-faire, no questionamento do belo e na contínua reinvenção do legado de Gabrielle Chanel, que agora está nas mãos de Blazy.

Você pode assistir ao desfile na íntegra abaixo:

CHANEL SS25 HAUTE COUTURE

Fotos: Reprodução Chanel Oficial / Vídeos: Reprodução Instagram Chanel Oficial

Escrito por: Caroline Menis | Editado por: Flavia Cavalcante

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